terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Identidades

Acordou, levantou-se da cama, calçou seus chinelos e dirigiu-se ao banheiro.

Agora em frente ao espelho, a imagem mostrava uma pessoa cansada da vida. Os olhos eram rodeados por olheiras profundas, a cor da pele se esvaía a cada dia, os cabelos branqueavam como o céu que nubla antes da ventania e a boca ressecava-se em busca de sossego. "A rotina mata qualquer um".

Lavou o rosto.

As mãos já demonstravam a passagem dos anos. O trabalho de policial, que há tempos servia de ganha pão, maltratava muito mais que recompensava. Entrar em vilas, em favelas, enfrentar bandidos de todos os níveis, ouvir o som de tiros... Ver colegas mortos tão facilmente... Ver colegas vendendo-se para os assassinos, apenas em busca de mais dinheiro, é como também vê-los morrer... Ouvir de crianças o grito e assistir ao desespero. Não é fácil.

Apoiou-se na pia.

"O espelho não reflete a profundidade das coisas. Já vi olhos mais castigados que os meus".

Ligou o chuveiro.

"Sabe, as roupas pesam também. No inverno a gente se enche de roupa e não consegue nem andar direito". E a água jorra. O fechar de olhos quando o rosto se enxarca não esconde as figuras do dia a dia: O corrupto, o morto, o herói, o jovem, o morto, o funcionário fantasma, os colegas mais queridos, a cara do bandido...

Iniciou-se mais um dia de vida de Leonora, a mulher, a policial, a filha do Brasil.




LUCIANA PONTES.

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